A Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina (Alesc) aprovou, nesta quinta-feira (4), um projeto de lei que estabelece uma multa de um salário mínimo para quem portar ou usar entorpecentes em ambientes públicos no território estadual. A proposta, que segue agora para sanção do governador Jorginho Mello (PL), gerou debates acalorados sobre a competência legislativa para tratar do tema.
O deputado estadual Marquito (PSOL-SC) foi o único a votar contra o projeto, argumentando que a matéria é inconstitucional por ser de competência federal. “O debate sobre drogas é mais amplo. Se resolve com muita inteligência, pesquisa e investigação”, afirmou o parlamentar.
À CNN, o advogado Gustavo Sampaio, professor de Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense (UFF), explicou que a questão divide a opinião dos especialistas. “Os juristas se dividem entre aqueles que entendem que a matéria é de competência concorrente entre União e Estados, e aqueles que interpretam no sentido de que se trata de competência privativa da União Federal. Para quem interpreta pela competência concorrente, é possível que o Estado legisle e determine a imposição da multa”, afirmou.
Caso sancionada, a nova lei coexistirá com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que descriminalizou o porte de maconha no país, mas manteve a prática como ilegal. Isso significa que usuários da droga poderiam ser punidos duas vezes pelo mesmo ato, com diferentes sanções, segundo especialistas consultados pela CNN.
O Projeto de Lei
A multa estipulada pelo projeto catarinense será aplicada a pessoas autuadas por portar ou consumir drogas ilícitas em espaços abertos ou fechados nas proximidades de órgãos, instituições ou construções públicas, incluindo vias e parques. O valor da multa, de um salário mínimo (R$ 1.412 em 2024), será revertido ao Fundo para Melhoria da Segurança Pública do Estado de Santa Catarina.
“O objetivo desta proposição é bastante simples: criar mais um meio coercitivo para evitar a contaminação das ruas com indivíduos ‘fora de si’ e desorientados, facilitar o processo de limpeza dos espaços públicos e prezar pela segurança dos cidadãos catarinenses”, justificou o deputado Jessé Lopes, autor do projeto.
Decisão do STF
A decisão do STF estabelece que o porte de maconha para consumo pessoal deixa de ser crime, tornando-se um ato ilícito administrativo. As pessoas não podem ser condenadas criminalmente por portar até 40 gramas de maconha para consumo. No entanto, os usuários ainda estão sujeitos a punições como advertência sobre os efeitos das drogas e medida educativa de comparecimento a curso.
O Que Dizem os Especialistas
Especialistas consultados pela CNN apontam que, apesar de haver divergência entre juristas sobre a competência legislativa, a multa proposta é uma forma de punição administrativa que pode coexistir com a decisão do STF. O advogado criminalista Matheus Felipe de Castro, professor na Universidade Federal de Santa Catarina, explicou que, teoricamente, um usuário de maconha poderia ser punido duas vezes, com sanções diferentes — uma pela norma estadual e outra pela norma federal.
Luisa Ferreira, especialista em direito penal, afirmou que, em tese, a lei não conflita com a decisão do STF por ser uma “multa administrativa”. No entanto, ela destacou que, se algum órgão entender que a lei estadual sobrepõe a decisão da Corte e entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), o Supremo poderia anular a legislação catarinense.
Em caso de ADI, a Suprema Corte analisaria se a lei estadual está de acordo com os parâmetros fixados pela Constituição da República, que define as regras de partilha de competência legislativa entre a União, os Estados e os Municípios, conforme explicou Gustavo Sampaio.
Thiago Bottino, professor da Fundação Getúlio Vargas Direito – Rio, disse que “os governos estaduais têm competência para regular normas de conduta e punir o descumprimento dessas normas”. Dessa forma, não haveria problema em haver duas punições distintas.
*Com informações da Agência Alesc*