As relações entre Brasil e Nicarágua sofreram um novo golpe nesta semana, após a expulsão do embaixador brasileiro Brano de Souza pelo governo nicaraguense. Em resposta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu expulsar a embaixadora nicaraguense Fulvia Patricia Castro Matu, marcando um momento de tensão diplomática entre os dois países.
O movimento reflete o crescente distanciamento entre Lula e o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, que já vinham se afastando desde que o papa Francisco pediu a Lula que intercedesse em favor de religiosos sequestrados na Nicarágua, um pedido que Ortega ignorou repetidamente. Esse episódio é mais um exemplo das crescentes críticas ao regime de Ortega, que há muito deixou de ser visto como uma liderança de esquerda tradicional e passou a ser caracterizado como cada vez mais autoritário.
A Ascensão e Transformação de Daniel Ortega
Daniel Ortega chegou ao poder após a Revolução Sandinista em 1979, que pôs fim a uma ditadura de direita na Nicarágua. Inicialmente visto como um líder de esquerda, Ortega foi eleito presidente em 1985, mas perdeu o poder em 1990. Após dois fracassos eleitorais, ele voltou à presidência em 2007, mas com uma abordagem significativamente diferente.
Especialistas como Carolina Silva Pedroso, da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), e Rafael Ioris, da Universidade de Denver, destacam que Ortega, desde seu retorno ao poder, minou progressivamente as instituições democráticas da Nicarágua para garantir sua permanência no comando. Com o tempo, o regime de Ortega passou a ser mais identificado pelo autoritarismo do que por uma ideologia de esquerda.
Repressão e Controvérsias
Nos últimos anos, o governo Ortega tem sido marcado por repressão violenta contra opositores e pela eliminação de barreiras à sua reeleição. As eleições de 2012 e 2016 foram marcadas por denúncias de fraude e exclusão de opositores. Em 2021, a repressão atingiu novos níveis, com líderes da oposição sendo presos dias antes das eleições.
A perseguição à Igreja Católica, uma antiga aliada do movimento sandinista, também se intensificou. Ortega passou a apoiar movimentos neopentecostais, enquanto expulsava freiras, prendia padres e destruía imagens religiosas, um movimento visto como uma tentativa de consolidar seu poder.
Brasil e Nicarágua: Relações Complicadas
Apesar de compartilharem um passado de lideranças de esquerda, Lula e Ortega nunca mantiveram uma relação próxima. As recentes tensões diplomáticas complicam ainda mais as ambições de Lula de liderar a América Latina, colocando o Brasil em uma posição delicada. Segundo Regiane Bressan, da UNIFESP, o Brasil provavelmente buscará minimizar os danos e esperar o momento certo para tentar reconstruir as relações com a Nicarágua.
Com a escalada da repressão em seu próprio país e a deterioração das relações internacionais, o futuro do regime de Ortega permanece incerto, enquanto o Brasil enfrenta o desafio de lidar com um vizinho cada vez mais isolado e autocrático.